O mercado das fake News e os aspectos jurídicos
*Paula Melina Firmiano Tudisco
A propagação das “fake news” é uma das grandes preocupações do momento. Mas, afinal, o que seriam “notícias falsas”, na tradução do termo para o português?
A expressão é usada para se referir a notícias falsas ou imprecisas, que, na maioria das vezes, são divulgadas pela internet, de maneira extremamente rápida e eficiente.
É muito comum receber fake news em mensagens no Whatsapp e nos feeds de notícias do Facebook e do Twitter. Elas podem ser usadas para aplicar golpes, espalhar vírus, espalhar dúvidas infundadas sobre doenças, influenciar opiniões e até manipular o cenário político.
Existe um novo “mercado” que conta com empresas que produzem e disseminam fake news. Elas se utilizam de recursos como a manipulação de algoritmos para envolver o maior número possível de pessoas, que sequer se dão conta de que estão sendo usadas como peça fundamental dessa disseminação.
Suas manchetes alarmistas, com conteúdo falso, rendem muitos cliques. A audiência acaba atraindo anúncios publicitários que, por sua vez, tornam este mercado altamente rentável. Nos casos de postagens sem intuito lucrativo, a intenção é apenas gerar uma comoção pública – o que acaba envolvendo e prejudicando pessoas anônimas que, de repente, têm suas vidas expostas e são execradas na internet.
Casos
Foi o que aconteceu com uma mulher no litoral de São Paulo em 2014. Ela foi espancada até a morte em Guarujá após uma página no Facebook confundi-la com uma sequestradora de crianças.
Em 2016, um homem, morador do estado do Rio de Janeiro, precisou de esconder após sua foto circular em mensagens pelo Whatsapp o acusando falsamente de ser estuprador.
No final do ano de 2017 circulou a notícia falsa de que uma marca de refrigerante (Pepsi) estamparia a foto de Jair Bolsonaro em suas latinhas, em resposta à marca concorrente (Coca-Cola), que colocou no mercado latinhas com a foto de alguns artistas (de um lado, latinhas com a foto de Pabllo Vittar, conhecida por ser drag queen; do outro, Jair Bolsonaro, conhecido por pregar o “ódio” contra o público gay e transgênero).
Na cidade de Londrina (PR), uma página do Facebook disseminou o boato de que uma mulher, figura conhecida na cidade que recebe ajuda financeira das pessoas na rua, estaria, na verdade, “bem de vida”, curtindo férias em uma praia nordestina. A postagem, com conteúdo falso, teve milhares de compartilhamentos e comentários preconceituosos de todos os tipos. Isso acarretou sérios problemas a uma pessoa inocente, que nunca esteve “curtindo uma boa vida na praia” com o dinheiro que ganha nas ruas.
Quem já não se deparou com textos, compartilhados via Whatsapp ou Facebook, que falam que imãs de geladeiras, aparelho micro-ondas, desodorante, dentre outras coisas, são altamente cancerígenos? Que quimioterapia é ineficaz e biópsia espalha tumor pelo corpo?
E a disseminação de falsas promoções de marcas famosas? Quem já não se deparou com links para acessar e ganhar um chocolate de determinada marca, panetone, cosméticos e até passagem aérea gratuita?
As fake news podem ser produzidas e veiculadas inclusive por jornais e revistas de reputação ilibada.
Um dos casos mais famosos de fabricação de notícias falsas em todo o mundo ocorreu nos Estados Unidos, envolvendo um repórter que trabalhava para o “New York Times”.
Após meses produzindo matérias recheadas de observações inventadas e entrevistas que nunca aconteceram, o jornalista se demitiu e, tempos depois, sua história virou manchete do próprio jornal em que trabalhava: “Repórter do Times que se demitiu deixa longa trilha de enganação”.
Exemplos são o que não faltam!
Influência na política
Acredita-se que as fake news têm influenciado o cenário político mundial, impactando no resultado das eleições dos Estados Unidos em 2015 – que culminou na eleição do presidente Donald Trump –, no plebiscito sobre a saída do Reino Unido da União Europeia e na independência da Catalunha.
Analistas da área de tecnologia já sabem que há polos produtores de notícias falsas na Macedônia e na Rússia e que elas são feitas por meio de programação de robôs que criam textos focados em interferir em debates políticos.
Sabe-se que robôs ou “bots” (perfis falsos em mídias sociais) são capazes de distribuir mensagens pré-programadas em escala mundial, e que contas automatizadas motivam aproximadamente 20% dos debates em apoio a políticos.
Utilizando-se do “big data” (o conjunto de dados sobre determinado indivíduo que é armazenado na rede), candidatos podem aferir desejos íntimos de cada pessoa, oferecer mensagens personalizadas e adotar os formatos que mais lhe atraem. Isso quer dizer que o mesmo candidato pode divulgar suas propostas contra a legalização da maconha voltada exclusivamente para pessoas que compartilham dessa ideia e também pode divulgar o contrário, que é a favor da legalização da maconha, para aqueles que apoiam a ideia – sem que os dois grupos desconfiem de que se trata de uma notícia inverídica, veiculada com o único intuito de manipular a opinião pública.
Medidas contra as fake news
No Brasil, o ano de 2018 será de eleição para os cargos de Presidente da República, Governadores, Deputados e Senadores, e o país já se prepara para enfrentar uma avalanche de fake news e informações manipuladas.
O tema vem sendo discutido entre o Tribunal Superior Eleitoral e o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Comitê Gestor da Internet, Polícia Federal e principais provedores.
Os principais veículos da internet (Google, Facebook, Twitter e Whatsapp) alegam que estão trabalhando em conjunto com as autoridades para tentar reduzir a disseminação de notícias falsas. A tarefa, porém, não é nada fácil.
O Whatsapp dispõe uma ferramenta “antispam”, que bloqueia o envio de mensagens em grande escala oriundas de uma mesma conta. Já o Facebook vem tentando detectar manchetes “caça cliques” e diminuir a frequência com que elas são mostradas em seu feed.
Aspectos jurídicos
A responsabilidade penal e civil para quem cria e dissemina notícias falsas, já existe, mas é necessário identificar essa pessoa ou a organização que patrocina esse tipo de coisa.
Quando a divulgação de notícias falsas tem como alvo uma pessoa em específico, a conduta já é prevista no Código Penal como crime de calúnia, difamação ou injúria, e também é possível que haja a responsabilização civil do ofensor a pagar indenização por danos morais, dependendo do caso.
Contudo, há situações que não são individualizadas e acabam atingindo o direito de informação da população de receber notícias verdadeiras. Esses casos são mais difíceis de serem avaliados.
Atualmente existem três projetos de lei que tratam sobre a criminalização das fake news em tramitação no Congresso Nacional, mas os textos ainda dependem de debates e aprovações.
O trabalho dessa força tarefa é árduo, pois a livre circulação de ideias é a base da democracia, e controlar as fake news – e a consequente manipulação de dados – pode acabar esbarrando na censura.
Então, muito cuidado ao compartilhar notícias com base apenas na manchete, sem ler o seu conteúdo na íntegra. Não encaminhe áudios sem fontes, não compartilhe correntes sem checar a veracidade dos fatos e preste muita atenção no endereço da notícia – evite sites conhecidos por serem sensacionalistas e preste atenção na formatação e na ortografia da matéria, dentre outros cuidados básicos. Não acredite em tudo que lê!
*Paula Melina Firmiano Tudisco é advogada da gestão de Seguros Obrigatórios no escritório Küster Machado Advogados Associados. Formou-se em Direito (2009) pela Unopar (Universidade Norte do Paraná). Possui expertise em Contencioso Cível de Massa, voltado ao atendimento das Companhias Seguradoras de diversos ramos do seguro. Concentrando a atuação no DPVAT.
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