Miguel Bakun: O Olhar de uma Coleção
Livro&Mostra

A mostra “O Olhar de uma Coleção” se originou do livro homônimo sobre o artista paranaense Miguel Bakun (1909-1963). A publicação oferece leituras atualizadas, com textos críticos sobre a representatividade de Bakun nas artes visuais. É a primeira vez que a produção gráfica do artista é merecedora de especial atenção. O livro está disponível on-line e em formato impresso no museu.
A obra do artista contribui de maneira significativa para uma reconexão com a natureza e o meio ambiente. Bakun expressa as particularidades de uma percepção curiosa e gentil diante da natureza e, ao mesmo tempo, evidencia uma potência criativa inusitada por meio de impetuosas e ritmadas pinceladas ou grafismos presentes na fatura de seus trabalhos. “Um sujeito expressivo a capturar o mundo em sua arte com tamanha escuta e abertura, sendo capaz de construir uma obra de força poética e um riquíssimo pensamento visual”, pontua a curadora.
Paranaense de descendência eslava, esse pintor autodidata, encontrou sua expressividade na prática e na experimentação, através de uma forte ligação entre ser humano, paisagem e natureza. Nos 30 anos de trabalho, adotou poucos preceitos da pintura e da perspectiva, para a construção do espaço pictórico, o artista inventava de modo intuitivo suas próprias soluções. É desse embate direto que surge a afirmação de uma singularidade em sua obra. Sua paleta autoral de amarelo, azul e verde remete a uma brasilidade.
Obras inéditas
A mostra “Miguel Bakun: O Olhar de uma Coleção”, com curadoria de Eliane Prolik, apresenta um conjunto de aproximadamente 60 obras de Bakun, selecionadas do acervo particular do colecionador Walter Gonçalves, empresário paranaense, a maioria inéditas do público. São 25 pinturas e 24 desenhos associados a 5 obras-primas do acervo do Museu Oscar Niemeyer.
A última montagem de uma exposição sobre o artista foi há 15 anos, igualmente no MON e curadoria de Eliane Prolik.
Fenômeno artístico
O recente reconhecimento de Bakun, tanto no Brasil como internacionalmente, deriva de novas pesquisas, leituras críticas, publicações, exposições, presença em feiras de arte e acervos públicos. Prolik acentua: “Após sua inserção num cenário cultural mais ampliado e, especialmente no modernismo brasileiro, nos parece necessário revisitar sua obra aqui, em Curitiba, local onde ele a produziu, sobretudo nos anos 1940 e 1950. Precisamos aprender mais sobre ela, seu pertencimento ao nosso contexto e sobre nós mesmos”, afirma.
O historiador e crítico de arte Ronaldo Brito reforça a amplitude da obra de Bakun. “Há mais de uma década, a obra de Miguel Bakun deixou de ser um fenômeno local paranaense para se tornar parte intrínseca do rarefeito modernismo visual brasileiro. E toma lugar entre seus pares, Pancetti e Guignard principalmente, pintores que em um ambiente indiferente, senão hostil, abriam caminho no país para uma visibilidade moderna”. Sobre seus desenhos, comenta: “a tinta voraz de Miguel Bakun impregna a tela e vem a torná-la veículo do Eu expressivo do artista. Já os traços agitados de seus grafites e carvões, a se irradiar pelo papel, mobilizam as cenas. Os rabiscos quase aleatórios, espécies de vírgulas e semicírculos, mais ou menos arabescos, atravessam a cena como uma ventania. E nada escapa, inexiste espaço neutro para esse artista que vive seu estar-no-mundo como um incessante embate perceptivo, em constante mutação, fiel a seu expressionismo”.
Para Adolfo Montejo Navas, crítico de arte, curador e escritor, Bakun procurava a verdade da natureza (a verdade na natureza), uma concepção e um modus operandi não só visual, quanto cognitivo, pois a natureza-paisagem se metamorfoseiam. O grau de vida interior ou de poder interno em sua natureza divisada parece evocar até uma “sobrenaturalidade” como sentimento vital. “Há uma matéria informe de massas pictóricas, como uma pintura em combustão, uma microfísica pictórica onde os traços são evidentes. Miguel Bakun presenteia até hoje uma instabilidade, um olhar oblíquo, mais tangencial”, ressalta.
Colecionismo
Além do livro e da mostra sobre o artista, a proposta é pioneira no sentido de dar visibilidade e enfatizar o papel do colecionador da arte paranaense, como agente ativo pelo fortalecimento do patrimônio artístico cultural. O colecionador Walter Gonçalves, empresário nascido no Paraná, se dedica ao trabalho de Miguel Bakun há dez anos e possui 102 obras do artista, sendo o responsável por este projeto ser concretizado.
Seu interesse pela arte começou na infância. O pai foi negociante de antiguidades atuando em toda a região Sul do Brasil, e em sua casa havia uma biblioteca de história da arte e literatura. Sua mãe era uma exímia desenhista, pintora e, quando jovem, foi aluna de Theodoro De Bona, em Curitiba. “Minha história de colecionador de arte se inicia com a aquisição de uma marinha de Pancetti, depois uma têmpera sobre tela de Volpi. Há cerca de uma década me aproximei da obra de Bakun com mais afinco. É difícil de explicar, mas, reconheço-me dentro de suas pinturas e desenhos, talvez por ser paranaense também. Esta coleção, focada em Miguel Bakun, visa trazer maior reconhecimento a sua obra, demonstrar sua historicidade, trajetória de produção e oportunizar novos estudos e entendimentos”, conta o colecionador.
O colecionismo no Brasil vem ganhando maior relevância ao cumprir a função de apoio às instituições públicas, à cultura e à arte. Gonçalves explica que “as coleções e as instituições privadas trazem um importante reforço ao caminhar junto às necessidades desse contexto e na revelação de conteúdos expressivos da nossa arte. É importante que coleções particulares sejam oferecidas ao público neste processo de tornar a arte mais visível e significativa”, ressalta o empresário.
O artista

Crédito da foto: Cadi Busatto
Miguel Bakun (1909-1963) nasceu em Mallet, no Paraná, de descendência ucraniana. Entra para a Marinha na adolescência, onde conhece o marinheiro e, posteriormente, artista José Pancetti. Em 1931 vai para Curitiba e dedica-se às artes visuais como autodidata. Vive intensamente o ambiente artístico da cidade, expondo em galerias, museus e salões de arte. Considerado um dos pioneiros da arte moderna no Paraná, sua obra possui uma percepção muito sensível da natureza, tendo como principais temas as matas, pinheiros, árvores em floração, lagos e afins, regiões suburbanas e as vistas da cidade.
Suas obras foram recentemente exibidas nas mostras: Miguel Bakun: Natureza e Destino, Instituto de Arte Contemporânea (IAC), em São Paulo e Casa Andrade Muricy, Curitiba (2009); Miguel Bakun: Na Beira do Mundo, Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba (2010); Aprendendo com Miguel Bakun – Subtropical, no Instituto Tomie Ohtake e individual na Galeria Simões de Assis, em São Paulo (2019); Gabinete Miguel Bakun, na feira Art Basel pela Galeria Simões de Assis, em Miami (2021); e na individual do artista, na Galeria Mendes Wood, em Bruxelas (2024).
Nesta inauguração em março, no MON, “Miguel Bakun: O Olhar de uma Coleção” entra no rol das grandes exposições sobre o artista, um projeto que une obras inéditas, uma curadoria criteriosa, um livro, conversas críticas e atividades educativas coordenadas com a proposta, facilitando o acesso e fortalecendo o conhecimento do público da obra de Miguel Bakun, ações fundamentais para valorizar o patrimônio cultural do estado.
Link para a publicação on-line
www.miguelbakun.com
@miguelbakun_finearts
Projeto Miguel Bakun: O Olhar de uma Coleção
Eliane Prolik
Artista visual, curadora, editora e produtora. Foi curadora da mostra “Bernadete Amorim – Entremeios”, MUMA (2023); “Mario Rubinski – O Espaço Imantado”, em parceira a Adolfo M. Navas, no MON (2023); “Antonio Arney – Estruturas e Valores”, em parceria com Adolfo M. Navas, MON (2018); “Miguel Bakun – Na Beira do Mundo”, em parceria com Ronaldo Brito, MON (2010); “Miguel Bakun – A Natureza do Destino”, na Casa Andrade Muricy e Instituto de Arte Contemporânea, em São Paulo (2009).
Walter Gonçalves
Há uma década, o empresário paranaense coleciona e se dedica à pesquisa da obra de Bakun. Formado em Engenharia Química pela UFPR, possui cursos de especialização em administração de empresas e finanças, como: Columbia (New York), Vanderbilt (Nashville – USA), EMLyon (Lyon – França), London Business School (Londres), Cambridge University (Cambridge – UK). Desenvolve atividades da pesquisa e do colecionismo principalmente da arte moderna brasileira.
Ronaldo Brito
Crítico, historiador da arte e poeta. Foi professor do Programa de Pós-Graduação em História Social da Cultura da PUC-Rio de Janeiro. Na década de 1970, escreve no semanário Opinião e desde então publica estudos sobre o Neoconcretismo, Miguel Bakun, Mario Rubinski, Eduardo Sued, Sérgio Camargo, Iberê Camargo, Amílcar de Castro, Tunga, Waltércio Caldas Oswaldo Goeldi, Yole de Freitas, Célia Euvaldo, entre outros. Em 2005, a Editora Cosac Naify lançou o livro Experiência Crítica, uma coletânea de seus textos sobre a crítica.
Ivo Mesquita
Crítico, curador, historiador de arte e jornalista. Foi diretor do Museu de Arte Moderna de São Paulo-MAM/SP (2000-2002); curador chefe e diretor artístico da Pinacoteca do Estado de São Paulo (2003-2015); curador Chefe da 28ª Bienal de São Paulo, FBSP (2008) e professor visitante do Center for Curatorial Studies, Bard College, Nova York (1996-2007). Historiador, curador e escritor independente desde 2015. Membro da Diretoria do Comitê Internacional dos Museus de Arte Moderna-CIMAM entre 2007 e 2013.
Marianna Camargo – Palavra – Assessoria de Comunicação
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