Esculturas da Memória: Thomas Schütte e Tatiana Trouvé redefinem o passado em Veneza

Reprodução Internet Thomas Schütte e Tatiana Trouvé redefinem o passado em Veneza

Veneza, uma cidade famosa por sua história e arquitetura, se torna, mais uma vez, um palco para discussões sobre memória e identidade. Desta vez, dois nomes de peso da arte contemporânea, Thomas Schütte e Tatiana Trouvé, apresentam suas exposições que convidam o público a revisitar o passado por meio de esculturas e instalações que quebram as barreiras entre o tempo, o espaço e a percepção.

Na Punta della Dogana, o renomado escultor alemão Thomas Schütte oferece uma vasta retrospectiva de sua carreira. Com mais de 150 obras, que vão de aquarelas a grandes esculturas em bronze, ele apresenta uma visão desconfortável e ao mesmo tempo sedutora da condição humana. Suas esculturas, com figuras deformadas e expressões intensas, causam uma sensação de estranhamento, convidando o espectador a refletir sobre a fragilidade e a complexidade do ser humano. Segundo o curador da exposição, “Schütte faz do desconforto um convite à reflexão sobre a nossa humanidade. Suas figuras representam não apenas o corpo, mas o próprio espírito humano, distorcido, mas jamais perdido.”

Entre as peças mais impactantes, destacam-se suas figuras femininas e masculinas que, embora imponentes, parecem à beira de se desfazer, como se o tempo as tivesse corroído. A deformação não é uma busca pela fealdade, mas uma maneira de ressaltar a transitoriedade da vida. 

Por outro lado, a instalação de Tatiana Trouvé no Palazzo Grassi oferece uma experiência visceralmente diferente, mas igualmente profunda. Trouvé, conhecida por seu trabalho com a manipulação do espaço e do tempo, cria um ambiente de reflexão através de objetos cotidianos que, ao serem reproduzidos em materiais nobres como bronze e mármore, ganham um peso simbólico imenso. Seus objetos — desde cadeiras e mesas até mapas e livros — não são apenas representações de coisas comuns, mas portadores de memória, de histórias não contadas. Em sua obra, “os objetos são como cápsulas do tempo. Eles carregam em si uma carga emocional que muitas vezes não percebemos até que sejam retirados de seu contexto original”, explica a artista.

A instalação de Trouvé é uma verdadeira imersão no conceito de memória, onde a ordem do espaço e a disposição dos objetos criam uma sensação de deslocamento temporal. A obra de Trouvé não apenas questiona o que é lembrado, mas também como o passado pode ser preservado, reinterpretado e até mesmo perdido ao longo do tempo.

Marta Fadel Martins Lobão, advogada e especialista em arte, que tem acompanhado o desenvolvimento da arte contemporânea nos últimos anos, enfatiza o impacto dessas exposições: “A arte tem um papel crucial em como entendemos e reinterpretamos o passado. Quando falamos de memória, não estamos lidando apenas com o que foi registrado, mas com as lacunas e os silêncios que a história deixa. Thomas Schütte e Tatiana Trouvé não apenas registram a memória, mas a reconfiguram, oferecendo novas lentes para entendê-la.”

Marta Fadel Martins Lobão acrescenta: “A obra de Schütte, com seus corpos distorcidos, é um reflexo da maneira como a memória pode ser incompleta, ambígua e até dolorosa. Já Trouvé, com seus objetos elevados ao status de arte, traz à tona a ideia de que a memória está em tudo, até nas coisas mais simples, e que o nosso contato com elas pode ser profundo e revelador.”

“Vivemos em um momento em que muitas vezes tentamos apagar ou reescrever nossa história. A arte é fundamental nesse processo, porque ela nos permite confrontar o passado e, ao mesmo tempo, questioná-lo. Não se trata apenas de preservar o que foi, mas de refletir sobre o que ainda precisamos entender”, afirma a advogada e especialista em arte Marta Fadel Martins Lobão.

Essas exposições são uma oportunidade única para explorar como os artistas contemporâneos tratam a memória e o passado. Com obras que desafiam a percepção tradicional, tanto Schütte quanto Trouvé propõem um espaço de reflexão onde o passado não é apenas um registro estático, mas uma constante ressignificação.

Michele Rocha

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