ENTREVISTA COM O PROFESSOR DE YOGA CHRISTYANO EDUARDO RICETTI

 

Christyano Ricetti, formado no Antigo Curso Livre de Yoga das Faculdades Integradas “Espírita”, graduado em Pedagogia – Universidade Castelo Branco, pós-graduado em Docências do Ensino Superior em Yoga – Faculdades Integradas “Espírita”. Atualmente é professor nas Faculdades Integradas “Espíritas” no Curso Superior de Formação Específica em Yoga, assim como no Curso de Pós-Graduação em Yoga da mesma Instituição. É professor no Centro de Educação Estação Criança, Escola Evolutiva e Escola Pequeno Cidadão em São José dos Pinhais. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Ensino-Aprendizagem. Na área do Yoga, com crianças, adultos, gestantes, idosos e pessoas com necessidades educacionais Especias. Idealizou, implantou e coordenou o Projeto de “Yoga Integral” Para Pessoas Com Necessidades Educacionais Especiais, por mais de dez anos, na Escola Especializada Amor Perfeito, APAE – São José dos Pinhais. É professor e proprietário, juntamente com a esposa Gisele Ricetti, da Casa de Yoga Maha Devi.

 

Katia Velo – Inicio a entrevista buscando esclarecimento sobre uma dúvida que surgiu tão logo comecei a pensar sobre o tema. Afinal é yôga, yoga ou ioga. Usa-se artigo feminino ou masculino? E, enfim, há alguma mudança etimológica?

Christyano Ricetti – Yoga é um termo de origem sânscrita de gênero masculino, sem acento circunflexo, no que entre outras coisas significa, julgo junção, união, comunhão. E quando incorporado à nossa língua: Ioga.

 

KV – Como e quando começou o seu interesse pelo Ioga?

CR – Sempre tive curiosidade por assuntos como cultura antiga, religiões, espiritualidade, saúde, filosofia e arte. Por quase seis anos passava parte das minhas horas de almoço na Biblioteca Pública do Paraná, pois trabalhava em frente. E foi em uma dessas idas à biblioteca que encontrei um folder que trazia informações sobre dois cursos das Faculdades de Ciências Biopsíquicas do Paraná que havia no Campus Dr. Bezerra de Menezes das Faculdades Integradas Espíritas. Embora já tivesse algum conhecimento teórico. Foi ingressando no curso Livre de Yoga que tive maior contato prático e teórico com as técnicas Yogues nos últimos anos da década de 1990.

 

KV – As atividades físicas também seguem tendências e modismos. A prática de Ioga, neste momento, está em evidência. Quais as principais diferenças entre atividades físicas (aeróbicas) e o Ioga?

CR – Sim, no entanto gostaria de tentar esclarecer que Ioga não é uma atividade física, embora, o Hatha Yoga ofereça uma quantidade significativa de técnicas que atuam sobre esta parte do nosso Ser. A palavra Ioga tem muitos significados sendo o mais comum é União. Não do verbo unir como uma atividade, mas, o estado de Unidade. Um estado de consciência livre de conflitos e sofrimentos. Porém, o que costumamos conhecer é um sistema técnico, portanto, prático, experiencial e vivencial. E nesse sistema, há um conjunto sofisticado de técnicas, das quais algumas correspondem a atividades físicas, que foram desenvolvidas ao longo dos séculos para capacitar o ser humano de responsabilidade para com seu corpo e sua mente, a estados saudáveis de conforto e presença. A busca dos praticantes de Ioga é em direção a um conhecimento de si, que inclui o cuidado com a manutenção e responsabilidade pela saúde física, emocional, mental e ambiental. Dentre as técnicas físicas está incluída uma parte: ASANA, exercícios psico-bio-físicos. Atividades respiratórias: PRANAYAMA. Os exercícios que promovem o relaxamento físico e mental. E a meditação, que sem ela não há Ioga. Por isso prefiro não comparar, são atividades diferentes com efeitos e resultados específicos. E guardadas as possibilidade individuais, a meu ver, podem ser praticadas pelas mesmas pessoas.

 

KV – Muito antes da medicina moderna, a prática do Ioga já ocorria no oriente. Como aconteceu esta ocidentalização.

CR – Sim, não se sabe exatamente quando surgiu, mas, o Termo Yoga já consta nos VEDAS, as escrituras sagradas consideradas mais antigas do mundo. Enquanto sistema técnico ressurge com grande intensidade no Séc. XV quando Swatmarama escreve o Hatha Yoga Pradipika que acrescenta mais técnicas e posturas sem abrir mão de muita meditação. Realmente existem muitas escolas modernas com influência ocidental, o que até certo ponto é válido, e algumas vem negligenciando a sua essência. E não estou falando de tradição, mas de distorção de essência. Acredito que isso se deu no final do século XlX, quando Swami Vivekananda, médico e monge indiano, discípulo de Sri Ramakrsna veio a Chicago, representando a Índia pela primeira vez no parlamento das religiões. Em seus discursos apresentou a visão indiana sobre a vida, suas escolas e DARSHANA, o VEDANTA e o YOGA. A plateia foi arrebatada por suas palavras. Os americanos o levaram ao grau de celebridade. Foi ele que abriu as portas para que outros instrutores e suas mensagens. Dando continuidade ao processo que levou o ocidente a tentar entender as boas novas daquele país que além de trazer sabor, cores, arte, joias, artesanatos, perfume, ao mundo há tanto tempo, também sabia sobre espiritualidade. E uma vez que olhamos e interpretamos ”com nossos olhos” a verdade do outro, equívocos podem acontecer… Isso, a meu ver, pode ajudar a configurar o que você chamou da ocidentalização do Ioga.

 

KV–  Um dos precursores do Ioga no Brasil foi o Professor Hermógenes. Fale-nos um pouco sobre ele.

CR – O professor Hermógenes cumpriu seu tempo este ano. E seu papel e legado são importantíssimos em nosso meio. São internacionalmente reconhecidos serviços prestados à humanidade por meio de seus estudos de Ioga. Sua prática e ensino inspira e inspiraram muitas pessoas, escreveu muitos livros sobre assuntos de Ioga, poemas, alguns se tornaram Best Sellers e seu Auto perfeição com Hatha Yoga, ultrapassou há muito tempo a barreira de 50 edições. É um grande incentivador da pratica de Ioga para o restabelecimento do corpo/mente e manutenção da saúde dentro de um caminho espiritual. Sua obra ajuda a fundamentar nossos estudos. É um mestre, e foi um trabalhador obstinado que fez de sua vida um bom exemplo.

 

KV – Como se pode verificar na sua apresentação, você atuou como professor de Ioga na APAE de SJP, durante 10 anos. Como era feito este trabalho? As crianças e jovens eram receptivos?

CR – A APAE foi a maior aventura e laboratório que tivemos a oportunidade de experimentar em nosso oficio até hoje. Costumamos dizer que temos muitos mestres e entre eles, em destaque, estão todos os alunos da Escola Especializada Amor Perfeito. Quanto ao projeto foi sempre experimental, porque era novo e nem sabíamos. Quando começamos, iniciamos com um “pequeno grupo” de 35 alunos todos com necessidades especiais na área mental, alguns com limitação física, auditiva, visual associadas. Numa aula experimental autorizada pela então diretora Professora Danuta Wierzinki, a Coordenadora Professora Maria Eli Alberti de Brito com a anuência da Professora Lurdes Herrera. Ao longo dos anos conseguimos aumentar o número de aulas e consequentemente atender a um número maior de alunos, de todas as idades. Os resultados foram bons, a receptividade foi imediata e o comportamento dos alunos melhorou assim como sua motricidade e conhecimento de si. Alguns alunos que apresentavam algum tipo de agressividade, segundo os técnicos e professores e a nossa própria observação, também acalmaram. O projeto continuou até o ano de 2010, onde por motivos conhecidos pela sociedade são-joseense, pedimos com pesar o nosso desligamento da escola. Os alunos receberam bem a nossa proposta, demonstravam e falavam que gostavam das aulas. Muitas vezes, aqueles que ainda não estavam na ocasião, quando nos encontravam nos corredores da Escola perguntavam quando nós os buscaríamos. Atendíamos 150 alunos em 8 horas semanais na sede e sub-sede da Escola. Tenho saudades.

 

KV – Atualmente, além das aulas na Casa de Yoga Maha Devi, você realiza aulas com crianças em Escolas Particulares. Como são feitas estas atividades? Quais os principais benefícios no processo de aprendizagem?

CR – Sim, no momento em três Escolas na cidade. Sendo que em uma delas desde 2000. Atendemos crianças desde o berçário. Para as crianças bem pequenas disponibilizamos o nosso colo, atenção, carinho, acolhimento e segurança de acordo com a sua permissão. Utilizamos, na medida do possível, técnicas baseadas na massagem indiana, batizada em homenagem a sua inspiradora Shantala e apresentada ao ocidente pelo obstetra Frédérick Leboyer, da bioenergética suave, ou massagem da borboleta pela Dra. Eva Reich. Sempre respeitando a disponibilidade e estágio de desenvolvimento da criança e as possibilidades do ambiente que nos oferecem as escolas. O principal objetivo é a “cultura” do corpo. É por meio do corpo que experimentamos, conhecemos, sentimos e nos expressamos no mundo. É por meio dos sentidos que toda e qualquer aprendizagem pode ter sucesso, culminando em experiência. A criança é toda sensação, esta disponível à experiência direta, portanto, aprendendo o tempo todo. É por isso que os primeiros anos de vida, o indivíduo aprende muito mais do que no restante de sua vida. E tudo o que é fundamental para continuar vivendo e existindo. As aulas simplesmente acontecem, eles interagem, criam, brincam, desenvolvem e crescemos juntos a cada encontro. Que é sempre novo. É um grande exercício pessoal de presença. Mas isso tudo não quer dizer que não haja método. É importante ressaltar que não é uma simples brincadeira, mais uma recreação, mas uma brincadeira séria, pois sabemos que é brincando que se aprende. Em minha opinião, as pessoas mais preparadas e sensíveis é que deveriam estar dentro das Escolas de Educação Infantil e séries iniciais. Afinal é o início de tudo, de uma vida, são essas pessoas que plantam e regam a vida do ser nos momentos mais importantes. Mais puros e se relacionam com o melhor daquele ser. É ao mesmo tempo uma grande responsabilidade e uma bênção.

 

KV– Em um mundo onde estamos tão conectados a aparelhos elétricos e eletrônicos, acabamos ficando desconectados de nos mesmos. A prática da Ioga pode nos ajudar a ficarmos mais focados?

CR – Parece que isso é quase uma neurose humana. Parece que desde sempre o ser humano tem essa ânsia de ligação, de conexão de pertencimento – Será que é por que um dia nos cortaram o cordão umbilical e ainda não nos individualizamos inteiramente, não maturamos? – somos seres sociáveis e sociais. E o momento nos mostra o quanto isso continua muito forte. As religiões dizem que devemos voltar ao nirvana, ao paraíso, ao céu. A tecnologia é mais um meio ligação com o outro, mas, tudo acontece agora. E todos querem aparecer agora. E comentar agora. E curtir agora. Mas a vida acontece agora e é humana e não tecnológica. As redes sociais estão aí para deixar claro o quanto se quer fazer presente para os outros. As pessoas querem ser vistas a todo custo, querer ser comentadas curtidas. Essa necessidade de se fazer presente para os outros pode levar a uma ausência de si, e, portanto, de algumas relações pessoais importantes e próximas. Todas as técnicas de Yoga, no limite do seu alcance. Estados mais presentes de vivência. O exercício da presença ajuda no direcionamento e melhor uso da atenção.

 

KV – E sobre o aprendizado de Ioga pela internet?

CR – Ioga não é algo que se aprenda, é um estado de consciência que a mente não conhece. No entanto, é uma palavra que indica muitas coisas, dentre elas a união ou a libertação das condições auto-impostas. Não há nada que se venha fazer que o produza. Isto não é um produto do fazer reativo. A nossa cultura está muito orientada nesta direção. Não é uma cópia, nem uma reprodução mecânica. Mesmo que perfeita. Desde sempre, o conjunto de técnicas desenvolvidas com o objetivo de possibilitar a estabilidade do corpo, da mente, emoções, é transmitido de maneira direta. Existe um termo na cultura indiana para isso PARANPARA. Onde o aprendiz, após ser aceito pelo professor, recebe suas orientações de acordo com sua maturidade e nível de consciência para a compreensão e vivência de cada etapa de sua instrução. Antes de ser um sistema, é um estilo de vida que se alicerça em condutas éticas e morais adequadas e saudáveis que devem ser observadas antes da introdução de qualquer técnica. Mas isso já não ocorre desta maneira, principalmente fora dos verdadeiros ASHARANS, nós mesmos aprendemos um pouco do que sabemos em um curso acadêmico presencial junto de professores experientes de carne e osso, e, bem próximos.  Existem muitas formas de se aprender, que auxiliam, mas, parcialmente. Um professor, um instrutor com experiente orientação que vê e sente o aluno durante a sua prática que tenha experimentado, vivenciados as técnicas é imprescindível. Nenhum material de apoio substitui a relação que se estabelece entre o orientador e “seu” aprendiz. Nenhum livro, áudio, ou tela tem o poder de observação que um sério instrutor deve ter sobre os seus alunos. Somente o professor pode dar o suporte e incentivo necessário nas várias fases que o praticante passa em seu processo pessoal. Ele não deve ser um material de apoio. O professor que está no vídeo é visto, ele não vê o aluno. Receber um certificado de um curso EAD de Yoga?!

 

KV – Estamos na primavera e o “Festival das Cores Holi” praticado na Índia está se popularizando no Brasil. Comente um pouco sobre este Festival ou outros realizados na Índia.

CR – O Festival das Cores é um momento de grande alegria onde as pessoas celebram a Vida recepcionando a primavera, acontece no mês de março. E representa o triunfo dos Deuses sobre os Demônios. As pessoas desejam um Feliz Holi e lançam uns nos outros balões de água, pétalas e pós coloridos. Que a princípio eram feitos com ervas medicinais. As cores devem transmitir alegria e desejos positivos, o amarelo evoca piedade, o laranja otimismo, o azul a calma, o vermelho o amor e a pureza, o verde para a saúde e assim vai. Uma cultura antiga como a da Índia que tem como característica a manutenção de suas tradições, mas, que ao mesmo tempo absorve a influência dos vários povos ao longo de sua história tem muitos festivais. O KUMBH MELA, por exemplo, é o maior Festival Religioso do mundo, acontece na Índia e reúne mais de 100 milhões de peregrinos hindus durante dois meses para a comemoração do SHAHI SNAN para o banho que ajuda a purificar os pecados que acontece no rio sagrado GODAVARI, no SANGAM local de encontro dos rios sagrados, o Ganges, o Yamuna, Godavari e Saraswati.

 

KV-  “Caminho das Índias”, “Quem Quem Quer Ser um Milionário” ou “’Eu sou Malala”, respectivamente, novela, filme e livro como estes podem minimizar a riqueza cultural ou os preconceitos?  Você teria algumas indicações para quem deseja conhecer um pouco mais sobre a cultura indiana?

CR – Com exceção do “Eu sou Malala” são obras de ficção e tem sua interpretação, trazem alguns aspectos da cultura indiana. O Hinduísmo é o termo que generaliza as várias manifestações dessa cultura, não se trata apenas de Religião. E Bollywod e Tollywod tem uma produção bastante extensa.

 

Informações:

Casa de Yoga Maha Devi – Studio de Ioga

Endereço: Rua Capitão. Benjamim Claudino Ferreira, 1580 – Centro, São José dos Pinhais – PR, 83005-390

Telefone: (41) 3077-0514

2 Comments on ENTREVISTA COM O PROFESSOR DE YOGA CHRISTYANO EDUARDO RICETTI

  1. Célia V. R. Rodrigues // 30 de outubro de 2015 em 22:22 //

    Que bom oportunizar entrevistas como essa, com pessoas com vasto conhecimento, como o professor Christyano, que nos traz esses esclarecimentos sobre Yoga.
    Parabéns!

  2. Cara CÉLIA! Obrigada pelo seu apoio! Acredito ser fundamental algumas informações sobre o Ioga feito pelo Professor Christyano. Para mim é um grande privilégio e uma honra. Obrigada, Katia Velo

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