COLUNA KATIA VELO NO JORNAL FOLHA DA MULHER
P Á S C O A. MUITO MAIS DO QUE CHOCOLATE, COELHOS OU BACALHAU.
SER CRIANÇA, NA RUA, NA CHUVA, OU…
Quando eu era criança, todo mundo brincava e brigava na rua. Tinha as crianças mais dengosas, as mais briguentas, as que se davam bem em todos os jogos, os riquinhos, pois tinham mais brinquedos. Não me encaixava em nenhum destes grupos, mas queria fazer parte do grupo das que jogavam bem. E este grupo era das pretinhas. Era assim que a gente as chamava. E não era uma forma de xingamento não. Era uma forma carinhosa, pelo menos era o que eu sentia, pois tinha tanta vontade de ser como elas que pedia para a minha mãe fazer trancinhas no meu cabelo como as delas. Brincar na rua era sempre uma delícia, ruim mesmo era quando chovia e podia ser chuva de prego ou canivete que estava eu lá na porta da cozinha, chorando como uma louca para ir brincar. Mas, minha mãe falava não uma única vez, depois nem ligava para meu choro. Brincar e correr até cair e esfolar joelhos e cotovelos, mas sem reclamar para não apanhar (de novo) em casa. Na verdade, não me lembro de ter apanhado muito, mas as poucas vezes em que isto acontecia, fazia um verdadeiro drama, transformava numa tragédia. Tanto que ficava me imaginando dentro de um caixão branco, com flores brancas e roupas brancas e minha mãe chorando desesperadamente pedindo meu perdão.
NA ESCOLA, ESTUDAR E APRENDER A CONVIVER
Outras lembranças boas que tenho são da escola onde tinha muitas crianças, mais do que na minha rua inteira. Era um corre-corre, uma bagunça. Inicialmente tive dificuldade para reconhecer as letras, pois antes, só tinha feito bolinhas e risquinhos no caderno e cantava e brincava na escolinha, o que foi ótimo! Queria muito entender o que eram aqueles signos (as letras). No começo foi um pouco difícil, mas logo entendi como aquilo funcionava e então fiquei encantada. Quando consegui entender que a letra b com a, dava ba e ba mais ba, formava babá, logo já estava lendo tudo o que aparecia pela frente. Aprender a ler foi realmente mágico! Neste período escolar, os xingamentos eram muito comuns. Chamavam-me de “saco de osso”. Eu era realmente magra nesta época. Não dava para diferenciar a canela da perna, era uma coisa só, os braços eram gravetos. Engraçado como não me abalava com estas coisas, mas não era só eu, todos encaravam como algo normal. Se aquilo cansava muito, o negócio era partir pra briga, mas nunca gostei disto, já pensava na roupa que iria sujar, o cabelo despentear e na surra que iria levar em casa, então não valia a pena.
PÁSCOA SEM CHOCOLATE, MAS MUITO DOCE.
Minhas maiores ambições era ganhar uma roupa nova no aniversário e uma boneca no Natal. Eram só estas datas mesmo. Não tinha Dia da Criança, Páscoa, etc. No resto do ano, tanto as roupas como os brinquedos herdávamos de primos mais velhos. O vestido de noiva da minha mãe foi reformado e foi o meu vestido da primeira comunhão. Aliás, lembro-me perfeitamente deste período, gostava tanto das aulas de catecismo que pensei firmemente em ser freira. No dia da minha primeira comunhão, uma amiga da minha mãe me levou a um convento na Av. Santo Amaro (São Paulo/SP) e senti-me tão bem, tão calma neste lugar que pensei que morar lá, seria como estar no céu. Neste dia, compreendi que religião não era saber tudo o que a catequista ensinava, mas estar próximo de algo Divino é um sentimento pleno que nos enche de paz e amor. E por que contei tudo isto! Quero convidar você a fazer o mesmo. Vasculhe suas memórias, relembre seu tempo de criança. E não é para achar que aquele tempo é melhor do que o de hoje, pois o que já foi, já era. Mas, que aquele foi o seu momento. Reviva suas emoções. Descomplique. Veja como lidávamos com preconceito, bullying, falta de dinheiro, brigas, entre outras coisas, de forma mais simples, sem tanto peso. Não queira achar uma explicação para tudo. Reencontre a criança que você foi, pois lá está o seu verdadeiro eu. E, não há bacalhau ou chocolate que possa substituir esta plenitude. E é com este mesmo espírito que a convoco a resgatar o que há de mais puro e verdadeiro e vivencie-o. Ressuscite os seus verdadeiros e profundos sentimentos. Relembre, Reviva, Reencontre e Resgate o verdadeiro significado da Páscoa!
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