Abertura: Identidade e Não Identidade – Camille Kachani
“É certo que uma parcela considerável de artistas, sobretudo depois da queda do Muro de Berlim, voltou-se à “emergência da memória como uma das preocupações culturais e políticas centrais das sociedades ocidentais”.3 Essa retomada foi realizada de diversos modos. Contudo, há nos últimos anos um predomínio da forma documental e representativa que agora parece dar sinais de esgotamento. Pois na medida em que muitos desses trabalhos têm a pretensão de “denunciar” uma situação real, que teoricamente não faz parte do mundo da arte (e com isso buscariam “conscientizar” o público), observa-se que com frequência diversos trabalhos acabam limitados a mesma lógica binária que domina a realidade que se quer criticar. É óbvio que essa abordagem, apesar de ter gerado grandes obras, encontra-se numa encruzilhada. Tomando como pano de fundo tal panorama, a produção de Kachani ganha um sentido particular. Seus objetos flertam, a todo momento, com a natureza e a cultura ou com o universo dos artefatos e da arte. Entretanto, é a partir do registro do insólito que escolhe trabalhar essas questões, colocando desde o início a incoerência de se pensar por dicotomias. Diante de seus trabalhos, o espectador é convidado a reconhecer uma relação de ambiguidade entre a natureza e a cultura, por exemplo, quando vê folhas (artificiais) saindo de uma tela, ou quando um livro contém folhas e não letras, ou ainda quando uma parede de tijolos (que não é feita de tijolo) é invadida por plantas artificiais. Mais do que uma contraposição estanque entre natureza e cultura, a forma de construção desses objetos sugere que tudo é simultaneamente natureza e cultura, original e artificial, identidade e não identidade. E isso por meio de uma poética que, a meu ver, não deixa de se conectar com a disposição das coisas no mundo dos sonhos, onde os objetos vivem para além da lógica pré-concebida.” Trecho do texto Solilóquio de Taisa Palhares |
Enviado por Galeria Murilo Castro
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